quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Apoio a cientistas pode frear ilegalidades

Paulo Fortuna
Revista da Indústria
Publicação da Fiesp

A decisão do Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior (Camex) de
regulamentar os mecanismos para coibir medidas antidumping, anunciada em 17 de agosto, foi uma vitória da Fiesp, que vinha alertando o governo sobre os indícios da fraude em setores como calçados, escovas de cabelo e pedivelas (peças de pedal de bicicletas) e reivindicando mais rapidez na extensão da punição por dumping aos outros países envolvidos na triangulação. Os principais suspeitos de usarem esta prática – conhecida como circunvenção - são fabricantes chineses afetados pelas normas compensatórias.

Anteriormente, quando havia suspeita de uma operação dessa natureza, era necessário abrir novos processos contra empresas que estariam vendendo produtos a preços muito abaixo do valor de mercado (dumping), que levam de 12 a 18 meses para serem concluídos. Com a regulamentação da lei que havia sido promulgada em 2008, as medidas de proteção poderão se estendidas mais rapidamente para os países que revendem essas mercadorias, desestimulando a triangulação.

O diretor titular do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Derex) da Fiesp, Roberto Giannetti da Fonseca, ressalta que assim que foram alvos de sobretaxa antidumping, a partir do final de 2007,alguns produtos tiveram a importação originada da China quase zerada e, no mesmo período, as exportações de outros países dos mesmos artigos tiveram altas expressivas.

Na inicio de agosto último, Giannetti levou ao Ministério da Fazenda documentos
com dados que apontavam para a circunvenção no Brasil e compararam as práticas de outros países como EUA, membros da Comunidade Europeia e Argentina, para punir a circunvenção. A Argentina, por exemplo, regulamentou a medida 23 dias após aprovar a lei contra esse tipo de fraude.

“Nós gostamos de concorrência e não somos contra as empresas chinesas
venderem seus produtos no Brasil, mesmo com a desvantagem que levamos por conta de fatores como a sobrevalorização do câmbio e a carga de impostos. O que a Fiesp não abre mão é de defender até o limite as nossas empresas contra atos de concorrência desleal, como o subfaturamento de preços e a falsificação de origem”, afirma o diretor titular do Derex.

Gianetti já encaminhou à Receita Federal pedido de investigação para vários produtos importados que podem estar burlando as medidas de proteção. Mas, ressalta ele, Fiesp também está acompanhando de perto a tramitação de projeto de lei no Congresso Nacional que classifica como crime de evasão fiscal a prática de apresentar um certificado de origem disfarçado. “Essas empresas que achavam que escapariam impunes da fraude terão suas mercadorias apreendidas e ainda pagarão multas vultosas”, destaca ele.

O setor de escovas foi protegido, a partir de 2007, por medidas contra as práticas desleais chinesas, mas também passou a enfrentar concorrência de fabricantes que, formalmente, são de Taiwan, que até então jamais havia sido um exportador importante do produto, ressalta o presidente do Sindicato da Indústria de Móveis de Junco e Vime e Vassouras e de Escovas e Pincéis no Estado de São Paulo (Simvep), Manoel Miguez. A medida determinou que a importação desse
desse produto originário da China passasse a ter a cobrança de alíquota específica de US$ 14,49 por quilo de mercadoria.

Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, compilados pelo Derex, mostram que a participação de Taiwan nas vendas de escovas para o Brasil era pouco maior que zero até 2007,mas subiram para 51% no ano passado. Enquanto isso, no mesmo período, a fatia chinesa cai de 78% para 21%.

“As fraudes na importações de produtos chineses foram facilitadas pela demora
em regulamentar a lei que impediria o uso de terceiros países para contornar medidas antidumping”, ressalta Miguez.

O presidente do Simvep acrescenta que os produtores chineses, independentemente das práticas desleais, já levam vantagem por trabalharem com custos muito menores do que as empresas brasileiras, por conta de desoneração das exportações, custos trabalhistas mais baixos e taxas de juros reduzidas. Mas, destaca ele, as empresas do setor seu setor têm procurado enfrentar a concorrência procurando inovar em seus produtos, como o
desenvolvimento de novos desenhos.

No caso do setor de outro setor afetado pela circunvenção, o de calçados, os exportadores da China teriam adotado principalmente três formas de fraudar o sistema antidumping, que incluiu a cobrança de US$ 13,85 por par de calçados importados daquele país. A primeira delas é a falsificação de documentos de origem. A segunda maneira é a montagem de calçados em terceiros países a partir de componentes produzidos na China, sem a observação dos mínimos de conteúdo nacional para a caracterização de produção deste terceiro país. Outra alternativa encontrada para fraudar a medida antidumping é a importação direta de “calçados desmontados” para serem finalizados no Brasil.

O coordenador do Comitê da Cadeia Produtiva de Couro e Calçados (Comcouros) da Fiesp, Wayner Machado da Silva, lembra que as medidas de proteção aos calçados brasileiros, aliada à recuperação do mercado interno, abriram perspectivas positivas para o setor no País, um cenário bem diferente do que poderia ocorrer se os exportadores chineses mantivessem a venda de produtos com dumping no Brasil. “Em cinco anos, os prejuízos para as indústrias brasileiras se tornariam irrecuperáveis”, afirma Silva. Por isso, segundo ele, foi importante a medida que estende o antidumping para países que praticam a triangulação comercial.

Conforme números do MDIC, entre março e novembro de 2008 foram importados 25,2 milhões de pares de calçados da China, contra 3,2 milhões de pares somados da Indonésia, Malásia, Tailândia e Vietnã. Em setembro de 2009, houve a imposição de direito compensatório provisório contra os calçados chineses e em março de 2010 foi aplicado o direito definitivo. Os dados mostram que entre setembro e maio do ano passado as compras provenientes da China e dos outros países asiáticos praticamente ficou empatada – 9,6 milhões de pares e 9,3 milhões, respectivamente.

Taiwan e Índia também não apareciam como exportadores significativos de
pedivelas para o Brasil até 2007, quando os fabricantes chineses, que respondiam por 79% das vendas, foram punidos por medidas antidumping. No ano passado, a fatia da China para 46%, enquanto Taiwan ficou com 37% do mercado e a Índia atingiu 15%. A sobretaxa para as pedivelas chinesas foi estabelecida em
US$ 1,56 por quilo.

Representantes de outros setores que enfrentam a forte concorrência dos produtos colocados a preços baixos no mercado brasileiro defendem medidas compensatórias, mas ressaltam que são necessárias várias ações para que
os fabricantes nacionais possam trabalhar com as mesmas condições oferecidas aos produtores da China.

“O ideal seria o governo reduzir a carga de impostos para o setor, principalmente os que incidem na folha de pagamento”, afirma o presidente do Sindicato da Indústria do Vestuário Feminino e Infanto-Juvenil de São Paulo e Região (Sindivest), Ronaldo Mesijah. Ele ressalta que, no setor de vestuário, que usa mão-de-obra intensiva, o custo com pessoal tem um peso bem maior do que em outros setores da economia.

O presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq)
Synésio Batista da Costa, defende que os produtos chineses vendidos no mercado brasileiro sejam submetidos aos mesmos impostos trabalhistas pagos pelas indústrias nacionais. “Há uma concorrência desleal entre fabricantes de um país que paga a sua mão-de-obra e outra que não paga”, afirma o dirigente empresarial. Na avaliação, ainda deveria haver aumento do Imposto sobre Produtos Industriais (IPI) e do imposto de importação para os fabricantes chineses de brinquedos. “As alíquotas de importação deveriam ser cobradas no teto máximo de 35% e não no patamar de hoje, de 20%, afirma ele.

Para ele, o governo deveria ser mais agressivo nas retaliações aos produtores
chineses, sem temer os riscos de conflitos no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). “O Brasil não tem que se preocupar que as medidas possam pegar mal na OMC. O que pega mal é demitir os empregados no país e gerar empregos na China por conta da concorrência desleal”, afirma Batista.

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