quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Construtoras têm obras de shoppings espalhadas por vários estados

Paulo Fortuna
Para o Valor, de São Paulo

O cenário que combina um aquecimento generalizado no mercado nacional da construção, crescimento no número de clientes impulsionado pela “nova classe média” e o desenvolvimento de polos econômicos regionais proporcionou uma nova realidade para as construtoras que atuam na área de shopping centers. As carteiras de clientes estão cada vez mais espalhadas por diversas regiões do País e a expectativa é que a massa de consumidores incorporada nos últimos anos ao público-alvo dos shoppings mantenha as encomendas de obras em alta. Em contrapartida, as negociações com os empreendedores dos centros comerciais têm que levar em consideração uma conjuntura de custos crescentes e elevado uso de capacidade no setor.

As carteiras de clientes das construtoras apontam que, apesar de ainda existirem oportunidades de negócios em São Paulo, Rio de Janeiro e outras capitais, há empreendimentos surgindo por todo o Brasil. “Dos 10 shoppings em que participamos da construção atualmente, 50% estão localizados fora da região Sudeste, que sempre concentrou os empreendimentos do setor. São três obras em andamento no Centro-Oeste e duas no Nordeste”, afirma o diretor de Edificações Privadas da Concremat”, André Marinho de Vasconcelos.

Dos 17 contratos em andamento da Racional Engenharia, nove são da área de shoppings, sendo duas recentemente entregues, o BH Shopping, na capital mineira, e o Park Shopping Barigui, em Curitiba. Dos demais empreendimentos que ainda estão em obras, dois estão localizados no Rio (VillageMall) e São Paulo (Mooca Plaza) e os demais em outras cidades. “Há uma tendência de descentralização das obras do setor em direção a novos polos econômicos do País”, diz o gerente sênior do Núcleo de Desenvolvimento de Negócios da Racional, Marcos Vicelli, citando como exemplo o Shopping Sete Lagoas, que a empresa está construindo no interior de Minas Gerais.

A João Fortes Engenharia também está construindo dois empreendimentos com essas características, o Shopping Park Europeu, em Blumenau (Santa Catarina) e o Shopping Park Lagos, em Cabo Frio (Rio de Janeiro). “Os shoppings estão sendo construídos em regiões com grande potencial econômico, o Vale do Itajaí e a região dos Lagos”, afirma o diretor nacional de operações da companhia, Wagner Lofare. Segundo Lofare, o Park Lagos é o primeiro empreendimento deste porte naquela região.

Juan Quirós, presidente do grupo Advento, do qual faz parte a Serpal Engenharia, ressalta que as maiores oportunidades nas grandes capitais estarão na ampliação dos empreendimentos já consolidados, mas também destaca o crescimento dos negócios nos polos econômicos regionais. A Serpal participou recentemente da ampliação dos shoppings Pátio Higienópolis e Anália Franco, está na fase final da construção da nova torre de lojas do Iguatemi, na capital paulista, e começou as obras do shopping do Grupo Sonae em Londrina, no Norte do Paraná. “Antigamente não se pensavam em projetos de grande porte fora das regiões metropolitanas, mas o shopping de Londrina vai atender ao público de toda a região”, ressalta Quirós.

Os executivos avaliam que o ciclo de aquecimento do mercado ainda deve perdurar por alguns anos também por conta do aumento de renda e crédito, que ampliou principalmente o consumo da classe C. “A chamada nova classe média vai continuar a impulsionar o setor de shoppings nos próximos anos. Já a construção de empreendimentos voltados para públicos de alto poder aquisitivo pode começar a apresentar uma saturação”, diz Vicelli, da Racional Engenharia. “Acreditamos que o mercado de construção de shopping centers possa até dobrar de tamanho por causa do crescimento do número de consumidores”, avalia Vasconcelos, da Concremat.

As negociações entre as construtoras e os empreendedores dos shoppings passam por uma fase de “ajustes” – inclusive na discussão de valores – afirmam executivos da área. Na avaliação de Quirós, do Grupo Advento, as construtoras procuram buscar uma relação “mais equilibrada” com os empreendedores. “O aquecimento de todos os segmentos da construção civil provocou um aumento de custos em itens como a mão-de-obra especializada e o aluguel de equipamentos”, destaca Quirós.

“Não adianta os empreendedores negociarem com construtoras que apresentem preços baixos e depois não têm musculatura para bancar as obras”, acrescenta ele. O executivo ressalta que as obras de shoppings têm um grau de complexidade mais elevado do que outros tipos de construção. “No início das obras, temos apenas um cliente, que é o shopping. Ao final, temos que atender as exigências de uma série de lojistas, tanto o dono de uma loja de 20 metros quadrados, quanto aquele que tem 20 mil. E temos que atender bem a todos”, ressalta Quirós.


O Índice Nacional da Construção Civil (Sinapi), calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em convênio com Caixa Econômica Federal (CEF), variou 0,51% em outubro, acelerando 0,16 ponto percentual em relação ao resultado de setembro (0,35%). O acumulado do ano foi 6,34%, contra 4,93% observados em igual período de 2009. Nos últimos doze meses, a variação foi de 7,26%, enquanto no mesmo período anterior o índice ficou em 7,08%

O item materiais subiu 0,50%, acima da taxa de setembro (0,41%). A parcela de mão-de-obra registrou variação de 0,53%, superior a de setembro (0,27%). De janeiro a outubro, a alta dos materiais fechou em 4,26%, acima dos 3,41% de igual período do ano passado, e a mão-de-obra (9,16%) também teve resultado superior em comparação com período equivalente de 2009 (7,08%). Nos últimos doze meses, os materiais tiveram alta de 5,15%, enquanto a mão-de-obra subiu 10,14%.

As construtoras também buscam estratégias para evitar ao máximo riscos de atrasos ou perdas de qualidade nas obras. A João Fortes Engenharia trabalha com projetos de pré-moldados que possibilitam que a empresa transforme os canteiros de obras em “fábricas de shoppings”. “Com isso, conseguimos minimizar problemas como a dificuldades para a contratação de mão-de-obra especializada e a locação de equipamentos”, afirma Lofare.

Vicelli, da Racional, diz que estratégia da empresa é investir na fase de “pré-construção” dos shoppings, enquanto os ajustes finais da contratação das obras ainda estão em discussão. “No período de quatro a cinco meses, enquanto trabalhamos para melhorar os detalhes dos projetos, nos já vamos ao mercado e fazemos uma pré-reserva de equipamentos, por exemplo. Dessa forma, já temos tudo acertado quando iniciamos as obras e reduzimos os riscos de atrasos”, diz Vicelli.

Vasconcelos, da Concremat, ressalta que em qualquer área da construção civil a questão do prazo é essencial, mas neste setor os atrasos geram um problema extra, já que é receita que deixa de ser gerada para os shoppings e os lojistas.

“Um dos riscos do aquecimento do mercado é o descumprimento dos prazos por parte de construtoras que não estão bem estruturadas. Com o movimento de expansão, a capacidade de gestão das obras passa a ser notória”, destaca Vasconcelos. De acordo com ele, mais do que negociar os preços das obras, há a necessidade de apresentar soluções para que os shoppings racionalizem os custos de operação, mantendo o mesmo padrão de atendimento.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Cliente private quer segurança, liquidez e conhecimento

Paulo Fortuna
Para o Valor, de São Paulo

Atender às expectativa de quem tem pelo menos R$ 1 milhão disponível para investir nem sempre é uma tarefa simples e, após a crise financeira global deflagrada em 2008, tornou-se ainda mais complicada. “Muitos clientes que tiveram perdas durante a crise ficaram mal impressionados com o gestores de suas contas de private banking. Eles avaliam que os bancos foram muito imprudentes ou gananciosos e passaram a ser mais cautelosos com seus investimentos”, afirma o economista Celso Grisi, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP) e diretor presidente do Instituto de Pesquisas Fractal.

Estudo realizado pelo Fractal em abril deste ano mostrou que mesmo os mais insatisfeitos com a atuação dos bancos durante a crise não desistiram de manter seus investimentos no private, mas prometeram acompanhar mais de perto o destino do seu dinheiro. Grisi destaca que os clientes deste segmento passaram a cobrar mais conhecimento técnico sobre as operações financeiras oferecidas pela instituição.

“De um lado, os clientes passaram a preferir mais segurança e liquidez do que rentabilidade e, de outro, ele exigem explicações mais técnicas e embasadas sobre a regulamentação das aplicações e os riscos embutidos nas operações”, afirma o professor.

O economista lembra que nem sempre o cliente private conhece bem as especificidades do mercado financeiro ou tem tempo de acompanhar o que acontece no setor. “Neste caso, ele exige ser informado sobre qualquer mudança no mercado, como uma alteração na carga tributária, que pode afetar o seu investimento”, diz o economista.

O estudo do Fractal apontou que o principal item valorizado pelos clientes private foi a disponibilidade do profissional que o atende no banco. Em seguida, veio o
o conhecimento dos produtos e serviços oferecidos pela instituição financeira. “Organização, objetividade e eficiência no atendimento” apareceu como o terceiro item de destaque na pesquisa, feita com entrevistados. Na quarta colocação, a “transparência e sinceridade no relacionamento com o cliente” foi o mais lembrado. Do total dos entrevistados, 84% investiam somente no private dos bancos e o restante aplicava com gestores independentes.

O consultor financeiro Vinicius Gholmie já detectou a insatisfação de muitos de seus clientes com o atendimento da área de private banking de grandes instituições financeiras. “Em alguns bancos, o gerente private acaba dando prioridade para clientes que têm grandes volumes aplicados, enquanto aqueles que possuem investimentos na faixa de R$ 3 milhões não recebem a mesma atenção”, ressalta ele.

Uma estratégia adotada por Gholmie para lidar com a situação foi reunir várias contas de clientes private para fazer uma negociação conjunta com o gerente da área. “Com R$ 30 milhões em investimentos reunidos, consigo condições melhores de negociação com o banco”, explica o consultor financeiro.

O nível de qualificação do executivo desta área pode ser decisivo na decisão do cliente em continuar investimento no banco, destaca o economia Roy Martelanc, coordenador do curso de pós-graduação em private banking e corporate da Fundação Instituto de Administração (Fia). Martelanc ressalta que a crise global de 2008 e 2009 trouxe um novo paradigma para o setor: o mercado, com as perdas financeiras e enxugamento do setor, tornou-se mais exigente e quem tinha uma formação menos sólida tornou-se um candidato preferencial a perder o emprego.

Segundo Martelanc, a maioria dos bancos oferece cursos de formação internos sobre os produtos disponíveis, em especial os voltados para clientes de maior poder aquisitivo. Mas, lembra ele, nem sempre o profissional tem um conhecimento profundo de todos os mecanismos que existem no mercado. “Ele até pode conhecer quais são os produtos o banco oferece, mas isso não quer dizer que entenda profundamente como cada um deles funciona”, destaca o professor.

Foi justamente por conta da demanda pela qualificação técnica que a Fia implantou o seu curso voltado para a área a partir de 2008. De acordo com Martelanc, até então os profissionais interessados neste segmento procuravam pós-graduações oferecidas pela instituição com grades curriculares aproximadas.

O professor lembra que, em alguns casos, o resultado da falta de qualificação
pode ser a venda de um produto que não necessariamente seria o mais indicado para as necessidades do investidor. “Isso pode ser danoso não somente para o cliente, por conta da limitação do profissional que o atendeu, mas também para o banco, que pode ter a sua imagem comprometida”, diz Martelanc.

Mercado brasileiro se torna atraente

Paulo Fortuna
Para o Valor, de São Paulo

O crescimento do mercado brasileiro de private banking deve ampliar o volume de instituições financeiras interessadas disputar os recursos destes clientes milionários no País; “O Oriente Médio e os países emergentes, entre os quais o Brasil, são os principais focos de investimento no mundo e é natural que as grandes instituições financeiras globais tenham interesse no nosso mercado”, afirma Roberto Marchi, sócio da consultoria norte-americana Bozz & Company no Brasil. “Mas, por enquanto, o que existe é somente uma promessa de que pode haver uma competição mais acirrada no mercado brasileiro”, destaca o executivo.

Marchi ressalta que há bancos estrangeiros com foco na área de private que só poderão crescer em maior escala se investirem nos mercados que estão em expansão acelerada, como o Brasil. “Se um banco suíço, por exemplo, quiser se expandir na área de private, não tem como escapar de investir nos novos mercados emergentes”, afirma ele.

O sócio da Bozz & Company lembra que, mesmo que não tenham grande presença no mercado brasileiro, instituições financeiras internacionais podem trazer como diferencial uma escala global e novos instrumentos de atuação neste segmento.

Ele ressalta que as oportunidades no mercado local estão crescendo não apenas por conta de investimentos externos, mas também de brasileiros que anteriormente aplicavam o seu dinheiro no exterior e retornaram com o capital para o País. Segundo ele, esse retorno ocorreu tanto pelo aumento das boas oportunidades de negócio e da redução dos riscos no Brasil, como também pelas maiores restrições impostas internacionalmente para as operações off-shore.

O presidente do Comitê de Private Banking e diretor da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), Celso Portásio, também avalia que disputa pelos ativos deste mercado deve ficar mais acirrada. Mas, para ele, o movimento deve acontecer principalmente de instituições que já atuam no mercado e que devem ampliar os investimentos no setor.

Para Portásio, mesmo estabelecendo linhas de corte maiores para clientes de private bank, as maiores instituições financeiras não devem perder fatia significativa deste mercado no Brasil.

O professor de economia e de mercado financeiro da Escola Trevisan de Negócios, Alcides Leite, acha que a expansão da riqueza no Brasil gera oportunidades tanto para os grandes bancos quanto para os gestores independentes. Segundo ele, as empresas de menor porte podem investir num atendimento mais personalizado ao clientes mas, em contrapartida, as maiores instituições financeiras também têm como implantar estruturas segmentadas para adotar estratégias voltadas para nichos de mercado como o private banking.

Leite lembra que somente com a estabilização da economia os bancos brasileiros investiram mais fortemente no atendimento ao varejo, mesmo nas faixas de renda mais elevadas. Até então, ao contrário do que ocorria em mercados mais maduros como nos EUA, estas operações ficavam em segundo plano, em detrimento de operações de tesouraria, por exemplo, ressalta o professor

Indústria bilionária

Paulo Fortuna
Para o Valor, de São Paulo

O setor de private banking, voltado para clientes pessoas físicas com grandes somas para investir nos bancos, encontrou um ambiente de negócios altamente favorável para se expandir no Brasil. O crescimento econômico ampliou o número de milionários e o volume de dinheiro disponível, que é disputado pelas instituições financeiras com os serviços de wealth management (gestão de riqueza). De acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), o total de recursos investidos neste segmento no País já soma R$ 337 bilhões. Uma alta de 15,9% entre dezembro do ano passado e setembro último, segundo a Anbima, que pela primeira vez divulgou dados relativos ao setor no mercado brasileiro.

“O aumento da riqueza está diretamente ligado ao crescimento da economia, mas no caso do Brasil também há uma forte entrada de recursos externos e liquidez gerada por IPOs, fusões e aquisições de empresas”, afirma o presidente do Comitê de Private Banking e diretor da Anbima, Celso Portásio.

O executivo acredita que mercado local de private vai continuar a crescer acima dos níveis do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Ele ressalta que nos próximos anos a geração de riquezas no Brasil deve ganhar ainda mais impulso por conta de investimentos em infra-estrutura proporcionados pelo pré-sal, a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas no Rio em 2016.

Simultaneamente ao crescimento do volume de ativos, há um processo de consolidação do setor financeiro brasileiro e a determinação, em alguns grandes bancos, de uma linha de corte mais elevada para o cliente ser considerado private.
A norma da Anbima é que o cliente private deve ter um volume mínimo de aplicação de R$ 1 milhão, mas em diversas instituições financeiras o montante exigido é superior.
No Itaú, por exemplo, para ser private é necessário ter ao menos R$ 3 milhões para investir. O diretor executivo de Private Banking do Itaú Unibanco, Celso Scaramuzza, diz que instituição financeira passou pelo processo de fusão sem perdas na base de clientes deste segmento. Scaramuzza reconhece que o processo de união do Itaú/Unibanco pode ter causado algum desconforto aos clientes private.

“Neste tipo de processo, é obvio que você pode desagradar alguns clientes por conta de mudanças de rotina, mesmo que essas mudanças sejam para melhor. Mas, em contrapartida, houve ganhos, por exemplo, no aumento de ofertas de produtos no private”, afirma ele.

Segundo o executivo, as operações de private de banking do banco, que tem a liderança do setor no Brasil, totalizam ativos de pouco mais de R$ 100 billhões e já aumentaram neste ano 25% sobre 2009. Conforme Scaramuzza, uma das principais estratégias para continuar a crescer neste mercado e, ao mesmo tempo, manter a qualidade do atendimento, foi dividir os clientes private em três categorias de investidores e desenvolver produtos e estratégias específicas para cada um destes três segmentos.

O Itaú mantém no topo da pirâmide os clientes “ultra high”, com investimentos superiores a R$ 50 milhões, vindo em seguida os clientes “high” com aplicações entre R$ 10 milhões a R$ 50 milhões e, finalmente, os clientes que atuam na faixa entre R$ 3 milhões até R$ 10 milhões.
De acordo com ele, clientes “ultra hight” costumam ter uma tendência mais clarade preservação do patrimônio, com aplicações de prazo mais longo. “São investidores que podem abrir mão da liquidez imediata, visando um retorno de longo prazo”, diz o executivo. Já na outra ponta, as prioridades são diferentes: há necessidade de preservar a liquidez, de recursos de curto prazo e o investidor, em geral mais jovem, tende a aceitar um risco mais elevado.

O espanhol Santander, que está finalizando o processo de fusão com o Real, estabeleceu uma novo limite mínimo a partir deste ano para classificar seus clientes como private. Até então, a aplicação mínima necessária era de US$ 1 milhão e agora foi estabelecida em R$ 3 milhões.

Segundo a gerente de Private Banking do Santander Brasil, Maria Eugênia López, a mudança foi feita para adequar o padrão de atendimento aos clientes com níveis de aplicação mais elevados. Ela avalia que o Santander não tenha perda perdido clientes por contas da adequação.

Conforme a executiva, o objetivo é que os bankers - como são chamados os executivos que atendem as contas milionárias- sejam mais do que gestores dos recursos destes clientes, atuando dentro de uma visão abrangente de atendimento, que inclui assessoria em planos de sucessão dentro das empresas e planos de previdência. “O banker virou um diretor financeiro ou de RH do cliente private”, afirma a diretora.

Maria Eugênia destaca ainda que há uma mudança recente no comportamento de muitos destes clientes no que refere à tomada de crédito no banco. “Neste ano, o volume de crédito concedido para clientes private subiu 50%”, diz Maria Eugênia. De acordo com ela, a maioria do crédito é concedido para clientes em busca de liquidez.

Na linha de atendimento “ultra hight” há clientes do Santander com até R$ 1,5 bilhão aplicados que exigem, além de uma gestão especial da seus investimentos, uma discrição absoluta por parte do banco, ressalta a executiva. “Ao contrário do cliente que aplica R$ 3 milhões, quem investe R$ 1,5 bilhão não faz a menor de ser identificado como private, muito pelo contrário, diz ela.

A área de private do Santander cresceu 15% neste ano em volume de ativos, que estão na ordem de R$ 30 bilhões. “O nosso objetivo é ser o maior banco estrangeiro na área de private banking no Brasil”, diz Maria Eugênia.

Instituições financeiras que reforçaram recentemente sua posição na área de private banking apostam que podem se beneficiar da insatisfação com o atendimento prestado pelos grandes bancos que passaram por processos de fusão, casos do Itaú/Unibanco e Santander/Real. O Banco Votorantim, por exemplou, adotou como estratégia investir no atendimento a estes eventuais descontentes. O principal foco são investidores acima de R$ 3 milhões, mas o banco também trabalha com clientes na faixa que parte de R$ 1 milhão.

No Bradesco, o mínimo de investimento de cliente private é de R$ 2 mihões, o dobro do que era estabelecido até julho de 2008. De acordo com o diretor do banco para a área de private, João Albino Winkelmann, a mudança também foi feita para “adequar o atendimento à demanda”. “Vai chegar um momento em que poderemos aumentar esse limite para R$ 3 milhões, mas não há nada decidido ainda sobre isso”, diz ele.

Segundo o diretor, o banco estabeleceu que cada “banker” da área pode atender, no máximo, 80 clientes private, mas a regra muda conforme o perfil da conta milionária. “Há casos em que um gerente atende apenas quatro contas”, afirma o executivo. Essas contas “ultra hight” chegam a alcançar a faixa de R$ 500 milhões de investimento no Bradesco.

Winkermann acrescenta que na categoria private o banco tem uma estrutura de serviços que seria inviável em outros segmentos de aplicação. “Por exemplo, oferecemos uma plataforma de investimentos de arquitetura aberta, em que o cliente pode montar o seu portfólio com qualquer produto do mercado, mesmo que seja de outra instituição financeira. Esse tipo de operação demanda tempo e é altamente especializado, afirma o executivo. Winckemann lembra que outras áreas do banco podem ser acionadas para auxiliar este cliente vip, como na análise de investimentos em novos negócios.

De acordo com Winkermann, o banco tem por política não revelar os volumes exatos do setor, mas diz que o banco já cresceu 22% em ativos no private em 2010 e esperar fechar o ano com uma alta de 27%. Segundo ele, o Bradesco é “seguramente o segundo banco do País no segmento private”.

Já o britânico HSBC, que estabelece uma linha de corte de R$ 2,5 milhões para o cliente private, aposta na presença global do banco como um ativo importante para conquistar o público de alta renda. “O HSBC está presente em 88 países e em mais da metade deles o banco tem operações private. Esta estrutura internacional está disponível para os nossos clientes”, diz o diretor comercial do HSBC Private Banking, José Augusto Miranda.

Segundo o executivo. também ocorre o movimento inverso, com clientes private de outros países utilizando a estrutura do banco no País para buscar portunidades no mercado brasileiro.

Miranda não revela os números do private do HSBC no Brasil, mas diz que o banco aposta no crescimento de suas operações no mercado local. O HSBC inaugurou recentemente um escritório em Recife e tem planos de implantar no próximo ano duas ou três novas unidades private no Brasil. Como seus maiores pares do mercado, o banco também oferece outros serviços, além dos financeiros, aos clientes private como,assessoria tributária e planejamento sucessório.

A maior instituição financeira brasileira, o estatal Banco do Brasil, também resolveu investir neste ano na área de private banking – a linha de corte da instituição está no limite da norma da Anbima, de R$ 1 milhão. O BB Private ampliou da equipe de consultores, de 83 para 111, e reestruturou a área para oferecer mais opções de investimento para os clientes.

A equipe foi reforçada com Flávio Humberto Pretti, da área de clientes institucionais e com experiência em produtos de tesouraria, que passou a ser o gestor de produtos do private do BB. Também foram contratados para área de definição das estratégias macroeconômicas do private os especialistas Pedro Vals, da Fundação Getúlio Vargas, e Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Cresce a busca por alto padrão

Valor Setorial/Construção Civil
Por Paulo Fortuna

O crescimento da economia, o consumo em alta, baixa taxa de vacância nos escritórios e a expansão e modernização dos sistemas de logística têm impulsionado o setor de imóveis comerciais no País. O planejamento de novos shoppings, empreendimentos voltados para a área corporativa e condomínios logísticos foram pouco afetados pela crise entre 2008 e 2009 e, segundo os executivos do setor, o cenário ainda é de investimento acelerado pelo menos nos próximos quatro anos.

Conforme os executivos que comandam companhias do setor, o aquecimento da economia estimula a instalação de novas empresas no Brasil e a expansão dos escritórios daquelas que pretendem mudar para locais maiores e mais confortáveis. O resultado que nos maiores mercados do País, São Paulo e Rio de Janeiro, a taxa de vacância dos escritórios vem caindo e a tendência é de alta nos alugueis, principalmente nos empreendimento com o padrão Triplo A, que reúnem alto nível de tecnologia, segurança e conforto.

Segundo dados da consultoria Jones Lang LaSalle, a taxa de vacância de escritórios de alto padrão na capital vem mostrando queda. No terceiro trimestre deste ano atingiu 7,5%, contra 8,5¨% nos três meses anteriores. No primeiro trimestre do ano, a taxa estava em 11%.

De acordo com dados do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo (Secovi-SP), no segmento de conjuntos de escritórios foram lançadas 2.140 unidades de janeiro a julho na capital paulista. O volume é 14,4% superior ao total lançado em igual período do ano passado (1.870 conjuntos).

Em 2009, mesmo com a retração da economia, 3.489 conjuntos foram lançados, contra 2.434 do ano anterior – ou seja, aumento de 43,3% em um ano. De acordo com as projeções do Secovi-SP, se o movimento de lançamentos de comerciais se comportar de modo semelhante ao de 2009 no segundo semestre, o mercado fechará o ano com 3.800 conjuntos de escritórios lançados no município.

O interesse do mercado em lançar novos conjuntos de escritórios é justificado pelos números aos preços de locação na capital paulista, em espaços classe A, de alto padrão. De acordo com a consultoria imobiliária Cushman & Wakefield, preço médio pedido de locação na capital paulista para os espaços classe A no terceiro trimestre fechou em R$ 91,2 m²/mês nas principais regiões pesquisadas, um aumento de 3,7% em relação ao trimestre anterior.

No Rio de Janeiro, onde há uma carência maior de escritórios de alto padrão, a pressão da demanda inflacionou ainda mais os preços dos aluguéis. O preço médio de locação para espaços classe A no Rio fechou pelo segundo trimestre consecutivo em nível recorde, alcançando a marca de R$ 141,6 m²/mês, ficando 36,7% acima do segundo trimestre do ano e registrando 60% de valorização em relação ao mesmo período do ano passado.

“Essa elevação nos preços é decorrente não só da falta de oferta mas também da entrega de novo estoque de maior qualidade a preços pedidos bem superiores à média”, diz Mariana Hanania, gerente de Pesquisa de Mercado para América do Sul da Cushman&Wakefield

“A taxa de vacância no segmento corporativo nos mercados de Rio e São Paulo está entre em patamares historicamente baixos”, atesta o diretor executivo da unidade de negócios de São Paulo da Brookfield Incorporações, Alessandro Vedrossi. Por esse motivo, aliado as perspectivas de que a economia continue crescendo, Vedrossi avalia que esse mercado deverá continuar aquecido, no mínimo, pelos próximos quatro anos.

Ele lembra que, devido a esse cenário, nem mesmo durante o período mais agudo da crise, entre o final de 2008 e 2009, esse mercado teve retração. O executivo ressalta ainda que os negócios devem ser movimentados por empresas que procuram migrar para conjuntos de escritórios de padrão mais elevado. Nesta área, a Brookfield concentra suas fichas principalmente nos mercados de São Paulo, interior paulista, Rio de Janeiro, Brasília, Goiânia e Curitiba.

O presidente da WTorre Properties, Bruno Laskowsky, ressalta que o aumento dos investimentos no setor também foi proporcionado por uma queda proporcional nas taxas de juros, que tornaram o investimento neste tipo de imóvel mais competitivo em relação a outros ativos financeiros. Mas ele destaca que ainda há muita demanda a ser atendida no mercado corporativo de alto padrão. “São Paulo tem 10,5 milhões de metros quadrados de escritórios e mais da metade destes não tem sequer ar-condicionado central. Empreendimentos triple A somam apenas 1 milhão de metros quadrados. Toronto, no Canadá, com apenas 2 milhões de habitantes, tem 11 milhões de metros quadrados de escritórios ”, compara Laskosky.

Com a demanda crescente e dificuldade de alocação de espaços para nos empreendimentos – principalmente em locais considerados mais nobres, a tendência é uma valorização dos aluguéis cobrados nos escritórios de alto padrão que estão chegando ao mercado. “Há três anos, o preço do metro quadrados no WTorre Nações Unidas 1 e 2 era na faixa de R$ 60,00. No Nações Unidas 3, que está em construção, o valor já saltou para R$ 110,00”, destaca Laskosky.

As perspectivas deste mercado fizeram com que grandes companhias do setor imobiliário ampliassem o seu foco para a área comercial. Há três anos, entre 7% e 8% dos negócios do grupo de consultoria e intermediação imobiliária Brasil Brokers estão concentrados na área, índice que hoje alcança 20%. “Esse mercado cresce a taxas 50% acima do segmento residencial”, explica Julio Pina diretor de Novos Negócios da Brasil Brokers, empresa que atua em 16 estados brasileiros.

Pina ressalta que além dos mercados tradicionais, como São Paulo e Rio, há grandes oportunidades de negócios em cidades que vem recebendo novos investimentos. É o caso de Itaboraí, sede do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), que vem atraindo diversas empresas com negócios na área. No início de outubro, a Brasil Brokers vendeu rapidamente todas as unidades de empreendimento na cidade composto de duas torres comerciais e um apart hotel.

Investir tanto em shoppings quanto em torres comerciais próximas ao centros de compras tem sido uma estratégia desenvolvida pela Multiplan. A companhia tem quatro shoppings anunciados que devem ser inaugurados até 2012., sendo dois no Rio - VillageMall e ParkShopping Campo Grande – e os outros em São Saulo - JundiaíShopping e ParkShopping São Caetano. E está desenvolvendo Morumbi Business Center (São Paulo), o Centro Profissional RibeirãoShopping (Ribeirão Preto/SP), ParkShopping Corporate (Brasília) e o Cristal Tower (Porto Alegre).

A JHSF também experimentou a receptividade do mercado tanto para shoppings para quanto para escritórios, aliado ao segmento de imóveis de alto padrão.
A empresa lançou o Parque Cidade Jardim, em São Paulo, que envolveu um valor geral de vendas de aproximadamente R$ 1,8 bilhão, com nove torres residenciais, três edifícios comerciais (o Cidade Jardim Corporate Center) e o Shopping Cidade Jardim. A velocidade das vendas surpreendeu até os próprios empreendedores.
“Acreditávamos que as vendas ocorreriam em cinco ou seis anos, mas elas foram realizadas em praticamente 3 anos”, afirmou o presidente da JHSF.

Segundo Auriemo Neto, o modelo do Cidade Jardim “foi amplamente entendido e aceito” e, com isso, a companhia está desenvolvendo um projeto semelhante em Salvador. cidade que tem também tem mostrado potencial de crescimento na área. Além do Horto Bela Vista, na capital baiana, a JHSF também está lançando em Manaus o Parque Ponta Negra, com sete torres residenciais mais o Shopping Ponta Negra.

Luiz Henrique Rimes, diretor nacional da João Fortes Engenharia, empresa com
sede no Rio de Janeiro, avalia que o aquecimento do mercado ainda causará novos aumentos de preços dos imóveis comerciais, tanto para a locação dos espaço quanto no valor dos imóveis. “O preço do metro quadrado dobrou nos últimos três anos e pode dobrar novamente. Isso tem uma ligação direta com o crescimento da economia. Mas é bom lembrar que ficamos estagnados anteriormente 15 anos, inclusive por conta da falta de financiamento para o setor”, lembra o executivo. De acordo com Rimes, cidades como Brasília e Salvador também mostram grande potencial de crescimento na área comercial.

Além do crescimento geral do PIB, o mercado de shoppings também vem ganhando impulso por conta do aumento da renda da chamada “nova classe média” e da expansão do crédito, avalia Cláudio Sallun diretor da Lumine, empresa especializada na administração de shoppings. De acordo com ele, há espaço para o mercado se expandir em todas as faixas de consumo, mas é na categoria de consumidores que migraram da classe D para a C nos últimos anos é que pode ocorrer um crescimento mais expressivo. ”Fizemos um estudo que apontou que, se esses consumidores passarem a comprar nos shoppings o mesmo que no varejo de rua, há espaço para a construção de 100 novos empreendimentos no País”, afirma Salllun.

No Rio de Janeiro há dois shoppings em construção voltados para este mercado da “nova classe média”. Em novembro está prevista a inauguração do Boulevard Shopping São Gonçalo, na baixada fluminense, que marca a entrada da Partage,
uma das sócio fundadores do Ache Laboratórios, no mercado de shoppings.


Segundo a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), seis novos empreendimentos foram inaugurados este ano e mais seis devem chegar ao mercado até o final de 2010. Para o ano que vem, as previsões são ainda mais promissoras: são 27 inaugurações previstas.

As perspectivas de crescimento da economia também aquecem os investimentos em novos centros de distribuição e logística. “A demanda é crescente não apenas por galpões com maior capacidade, mas também pelo aumento da qualidade das instalações”, ressalta Claudio Bruni presidente da BR Properties, companhia que hoje tem 40% do seu portfólio destinado a este setor.

A empresa concentra grande parte dos seus investimentos na área cidade de Louveira, localizada a da capital paulista e estrategicamente próxima do eixo rodoviário Anhanguera/Bandeirantes. Em junho, a empresa comprou dois galpões na cidade destinados a operações de logística, por R$ 157 milhões.

Segundo Bruni, a tendência é de que os novos empreendimentos logísticos tenham cada vez mais tecnologia embarcada, como softwares de gestão das cargas. Para o futuro, o executivo avalia que o mercado deve se encaminhar para mais investimentos em terminais intermodais de carga, integrando ferrovias e caminhões, por exemplo.

“Embora ainda estejamos longe do estádio de países como os Estados Unidos, o transporte de carga ferroviária no Brasil vem evoluindo e isso deve gerar um novo foco de desenvolvimento no setor”, diz o executivo da companhia, que tem centros de distribuição ocupados por empresas como Unilever, Boticário, Ceva e DHL.

A Cyrela Comercial Properties (CCP) é exemplo de companhia que vem apostando em todos os segmentos de imóveis comerciais. Na área de logística, a empresa vem apostando em empreendimentos localizados em São Paulo e no Rio de Janeiro. O presidente da CCP, Roberto Perroni, ressalta que, além do aumento da atividade econômica e do consumo, as medidas para reduzir o tráfego em São Paulo estimulam a implantação de centros de distribuição numa distância de até 100 quilômetros da capital paulista. “As empresas têm que dimensionar a distribuição por conta de medidas que restrigem a circulação de caminhões nas grandes cidades”, como a proibição de circulação de caminhões na Marginal Pinheiros, diz ele.

Já no segmento de escritório de alto padrão na capital paulista, a CCP tem concentrado esforços na área localizada entre as avenidas Juscelino Kubtsheck.
e Faria Lima e está construindo, na Avenida Paulista, a Torre Matarazzo, um empreendimento que vai combinar escritórios Triplo A e um shopping voltado para o público de alto padrão. A empresa tem por enquanto dois shoppings em seu portfólio, mas já tem previstos outros quatro empreendimentos na área.

Mais 10 anos para eliminar o déficit do saneamento

Valor Setorial/Construção Civil
Por Paulo Fortuna

A área de saneamento básico, que apresenta um grande déficit que só poderá ser resolvido no longo prazo, acabou por se transformar numa grande oportunidade para o setor privado, tanto para a realização de obras e venda de equipamentos, quanto para a operação dos sistemas de água e esgoto. Os negócios se tornaram mais promissores com o aumento dos gastos com o setor nos últimos anos e a promulgação da Lei do Saneamento, com regras que deram mais garantias às companhias sobre seus investimentos.

De acordo com dados de 2008 do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) compilados pelo Instituto Trata Brasil, os investimentos para melhoria e expansão da rede de abastecimento de água no País passaram de R$ 1,3 bilhão em 2003 para R $ 2,2 bilhões em 2008, um aumento de 12% ao ano. Nesta área, o índice de atendimento da população no abastecimento de água atingiu 81,2%.

O quadro é bem pior no atendimento de coleta de esgoto, com um índice de apenas 43,2%. É deste total somente 34,6% do volume recebe tratamento. Na rede de esgotamento sanitário, os investimentos eram de R$ 1,8 bilhão em 2003 e cresceram a 7,5% ao ano, atingindo R$ 2,6 bilhões em 2008.

Segundo levantamento Trata Brasil junto ao setor, para que todos os brasileiros tenham acesso à rede de água e esgoto tratados são necessários recursos ao redor de R$ 270 bilhões, R$ 185 milhões a mais do que o total previsto para a área nas duas fases do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC 1 e 2) do governo federal, que chega próxima a R$ 85 bilhões.

Se for mantido esse volume médio de investimento previsto entre 2007 e 2014, ao redor de R$ 10 bilhões ao ano, a universalização do saneamento seria atingida apenas entre 2020 e 2025, conforme o secretário nacional de saneamento ambiental, Leodegar da Cunha Tiscoski.

A avaliação do presidente da Associação das Concessionárias Privadas de Água e Esgoto (Abcon) e da Cab Ambiental, Yves Besse, é de que o setor privado pode ter um papel decisivo para ajudar a reduzir o décifit no setor de saneamento no Brasil. Besse ressalta que a Lei do Saneamento estabeleceu regras para que o setor melhorasse o seu planejamento, o que estimulou a entrada de mais empresas privadas na área, o que já era permitido desde a Lei das Concessões, de 1995, que permite a transferência da administração de um serviço ou bem público à iniciativa privada.

Conforme dados da Abcon, desde 2007 a participação de empresas particulares – sozinhas ou em parcerias com companhias públicas – aumentou de 6% para 10% do total da população urbana atendida no País. “Mas a tendência é de que essa participação continue aumentando, seja através de modelos de concessões plenas ou de parcerias público-privadas”, afirma Besse. A estimativa da Abcon é de que a iniciativa privada represente 30% do setor no País em 2017, o que significaria hoje um atendimento a 45 milhões de usuários. Atualmente, o atendimento à população brasileira é feito principalmente por companhias estaduais (70%) e autarquias municipais (20%).

Segundo o executivo, as concessionárias privadas figuram entre as companhias de saneamento com melhor desempenho na cobertura de água e esgoto. E, destaca ele, podem ampliar a participação no setor inclusive em parceria com empresas públicas, como já vem ocorrendo a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), empresa aberta que tem como principal controlador o governo paulista.

A CAB Ambiental, empresa do grupo Galvão Engenharia presidida por Besse, está entre as empresas que fizeram parcerias com a companhia estadual paulista, nas cidades de Andradina e Castilho. A CAB tem 70% de participação nos negócios. A Sabesp também tem parcerias com companhias privadas nas cidades de Mairinque, com a Foz do Brasil (grupo Odebrecht) e com a espanhola OHL, em Mogi Mirim.

Desde 2008, a CAB mantém uma PPP administrativa com a Sabesp para ampliação do sistema produtos do Alto Tietê, na região Metropolitana de São Paulo. Na área de concessões plenas – na qual a empresa controla diretamente todas as operações de água e esgoto - – a CAB atua em cidades como Mirassol, Palestina, no Estado de São Paulo, Paranaguá, no Paraná, e Alta Floresta, Pontes de Lacerda, Colider, no Mato Grosso. Conforme Besse, a empresa estima um faturamento de R$ 120 milhões em 2010, R$ 40 milhões a mais do que no ano passado.

O setor da construção civil também acredita no potencial das obras de saneamento, mas dirigentes da área avaliam que a falta de planejamento ainda é um fator de atraso na redução dos déficits de água e esgoto. “Não é por falta de recursos financeiros que não são desenvolvidos projetos e obras de saneamento. Há falhas de gestão por parte de municípios que, sem apresentar projetos consistentes, não conseguem acesso às fontes de financiamento”, afirma o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Pesada de Minas Gerais. (Sicopot-MG), Alberto José Salum, que participa da coordenação do Projeto Sanear é Viver, que prepara estudo com sugestões do setor da construção para a área de saneamento e deverá ser entregue ao novo governo federal eleito.

Segundo Salum, o estudo vai propor, entre outros pontos, que na área de saneamento sejam incentivadas parcerias entre o setor público e privado no desenvolvimento de obras e projetos, como ocorreu no programa “Minha Casa, Minha Vida”. “É necessário uma integração entre governo e setor privado para agilizar as obras do setor”, ressalta ele.

Estudo realizado pela Unicamp, encomendado pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), aponta que a área de saneamento básico movimenta hoje R$ 20 bilhões o que representa 0,59% do valor agregado total da economia nacional. Mesmo com todo o déficit no setor, o resultado é superior ao de países desenvolvidos comparados pelos pesquisadores, como Japão, Reino Unido, Bélgica, Alemanha e Itália, onde a média ficou em 0,26%.

O estudo apontou também apontou que para R$ 1 bilhão investido no segmento, seriam gerados 42 mil empregos, R$ 1,6 bilhão de valor da produção, R$ 800 milhões de valor agregado e R$ 76 milhões em impostos diretos e indiretos. Com os investimentos previstos nas duas fases do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC 1 e 2), da ordem de R$ 85 milhões, poderiam ser gerados quase 2 milhões de empregos, entre temporários – principalmente na construção civil – e permanentes.

Frederico Turolla, sócio da consultoria econômica Pezco, avalia que há uma tendência de crescimento do setor privado no saneamento, mas ressalta que as melhores oportunidades de negócio hoje para as companhia hoje estão nas PPPs. “Grandes companhias de saneamento, como a Sabesp e a Copasa, estão buscando parcerias com empresas privadas e isso tende a trazer mais eficiência às operações”, diz ele.

Turolla acrescenta que os megaeventos esportivos programados para o Brasil nos próximos anos, como a Copa do Mundo de 2014, podem ser grandes catalizadores para projetos de investimento em infraestrtura, mas lamenta que muitas das cidades-sede ainda apresentem índices negativos de cobertura de água e esgoto.

“Há grandes oportunidades de negócios na área de saneamento não apenas na contratação de obras, mas também no setor de vendas de equipamentos e de serviços, como sistemas de gestão e redução de perdas”, afirma a presidente da
da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), Cassilda Teixeira de Carvalho.

Ela lembra que a maior parte dos financiamentos para o saneamento hoje está atrelada a programa de melhoria de eficiência das empresas que, em alguns casos, chegam a desperdiçar mais da metade da água captada por falta de gestão adequada do sistema.

Segundo a presidente, a área de saneamento no Brasil vem atraindo inclusive o interesse de fornecedores de equipamentos internacionais, como do Canadá, Espanha e Portugal. Mas, segundo lembra, o maior gargalho hoje do setor está no fornecimento de mão-de-obra. “Há falta de profissionais na área de saneamento no País. Os que existem já estão contratados e os que estão sendo formados são insuficientes para atender a demanda”, diz.