segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Incentivos devem atentar aos impactos na produção

Paulo Fortuna
Para o Valor, de São Paulo

O Brasil pode fazer uma transição mais rápida para a economia verde, de baixo carbono, se os incentivos não tiverem foco somente na diminuição das emissões de gases de efeito estufa, mas também na redução dos impactos da produção sobre a biodiversidade. A avaliação é do coordenador do Núcleo de Economia Socioambiental da USP, Ricardo Abramovay. O pesquisador ressalta que existem hoje alguns mecanismos de incentivos à inovação no País - como os programas do BNDES e da Finep - mas ainda há uma “timidez extraordinária” em valorizar projetos que mirem a sustentabilidade na linha de produção, como na racionalização do uso de água e energia e nas pesquisas para o melhor aproveitamento dos insumos utilizados.

"O ideal seria vincular os mecanismos de financiamento à adoção de programas de sustentabilidade na produção das empresas, o que não costuma ocorrer hoje”, afirma Abramovay, que também é professor titular do Departamento de Economia da FEA e do Instituto de Relações Internacionais da USP. Para Abramavoy, também seria importante que o capital de risco, através de empresas de venture capital e private equity, apostassem mais em projetos de empreendimentos sustentáveis.

O pesquisador acrescenta ainda que deveriam haver mais incentivos para a implantação de projetos na região Amazônica que estimulassem a preservação da biodiversidade. “A maioria dos projetos em implantação na Amazônia acabam, ao contrário, contribuindo para a destruição da biodiversidade”, afirma o professor da USP. Segundo ele, o próprio poder público contribui para o quadro negativo na região, não só pelo financiamento de iniciativas pouco inovadoras, como a pecuária, mas também pela implantação de obras que acabam contribuindo para a destruição das florestas.

Abramovay ressalta que o Brasil está numa situação privilegiada neste processo de transição para a economia verde, já que pode compatibilizar o crescimento econômico com a preservação dos serviços ecossistêmicos básicos, diferentemente do que ocorre, por exemplo, com a China e Índia, países com populações imensas e que estão realizando investimentos pesados em projetos de infra-estrutura.

“A infra-estrutura desses países não permite que eles possam abrir mão nos próximos anos do uso intensivo de combustíveis fósseis, embora estejam investindo, no longo prazo, em outras formas de energia limpas e renováveis”, destaca ele. Em contrapartida, a matriz energética brasileira depende de combustíveis fósseis em pouco mais de 50%, enquanto a média mundial supera 85%.

Abramovay ressalta que há novos paradigmas na atuação das empresas que podem ser reforçados com investimentos em projetos sustentáveis. “A mudança de comportamento das empresas ocorre em grande medida pela participação dos consumidores e de movimentos sociais. Cada vez mais as empresas estão aderindo a indicadores de desempenho social e governança corporativa”, destaca o pesquisador.

O professor acrescenta que, apesar da importância estratégica de que a economia verde ocupe o centro da inovação, o País não pode prescindir de políticas públicas que tratem dos efeitos da expansão populacional e do crescimento econômico, como a questão do espaço dos veículos nas grandes cidades. “É cada vez mais grave o problema da mobilidade urbana e isso tem que ser resolvido com investimentos em sistemas de transportes públicos”, exemplifica Abramovay.

Na área sociambiental, as ações do BNDES ocorrem através de financiamentos de longo prazo, subscrição de valores mobiliários e prestação de garantia. O BNDES realiza financiamentos conforme a modalidade e a característica da operação. Os três mecanismos de apoio (financiamento, valores mobiliários e garantias) podem ser combinados numa mesma operação financeira, a critério órgão de fomento do governo federal.

Também são oferecidos programas de financiamento que podem se vincular a mais de um produto e visam a atender a demandas específicas, apresentando prazo de vigência e dotação previamente estabelecidos. O BNDES Finem é uma linha de financiamento, de valor superior a R$ 10 milhões, a projetos de implantação, expansão e modernização de empreendimentos.

O Programa BNDES Fundos de Inovação em Meio Ambiente tem o objetivo de realizar investimentos em empresas que desenvolvam tecnologias consideradas limpas, com ações como a redução da emissão de carbono e de outros resíduos sólidos e líquidos, o tratamento de resíduos e o uso mais eficiente de recursos (energia e outros insumos). O BNDESPAR participará com até 90% do patrimônio comprometido do fundo, limitando a R$ 135 milhões. O processo de entrega das propostas de candidatos a gestor do fundo se encerrou em 18 de julho e estão em fase de análise.

O Ministério da Ciência e Tecnologia deve divulgar nas próximas semanas um plano de investimentos em pesquisas voltadas à economia verde. O Ministério pretende investir em áreas como energias renováveis, economia do conhecimento e na economia do extrativismo de forma sustentável. Os investimentos serão feitos por meio de editais do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e também por mecanismos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e do próprio ministério.

Ainda que atualmente não possua linhas específicas para projetos ligados à sustentabilidade, a Finep, empresa pública vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, tem ampliado a sua “carteira verde” nos últimos anos. De acordo com dados da empresa, 35% da carteira reembolsável (financiamentos que devem ser pagos de volta) contratada ou em contratação desde 2004 se refere a 99 projetos relacionados direta ou indiretamente ao conceito de sustentabilidade, alcançando R$ 2,04 bilhões.