quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Indústria bilionária

Paulo Fortuna
Para o Valor, de São Paulo

O setor de private banking, voltado para clientes pessoas físicas com grandes somas para investir nos bancos, encontrou um ambiente de negócios altamente favorável para se expandir no Brasil. O crescimento econômico ampliou o número de milionários e o volume de dinheiro disponível, que é disputado pelas instituições financeiras com os serviços de wealth management (gestão de riqueza). De acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), o total de recursos investidos neste segmento no País já soma R$ 337 bilhões. Uma alta de 15,9% entre dezembro do ano passado e setembro último, segundo a Anbima, que pela primeira vez divulgou dados relativos ao setor no mercado brasileiro.

“O aumento da riqueza está diretamente ligado ao crescimento da economia, mas no caso do Brasil também há uma forte entrada de recursos externos e liquidez gerada por IPOs, fusões e aquisições de empresas”, afirma o presidente do Comitê de Private Banking e diretor da Anbima, Celso Portásio.

O executivo acredita que mercado local de private vai continuar a crescer acima dos níveis do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Ele ressalta que nos próximos anos a geração de riquezas no Brasil deve ganhar ainda mais impulso por conta de investimentos em infra-estrutura proporcionados pelo pré-sal, a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas no Rio em 2016.

Simultaneamente ao crescimento do volume de ativos, há um processo de consolidação do setor financeiro brasileiro e a determinação, em alguns grandes bancos, de uma linha de corte mais elevada para o cliente ser considerado private.
A norma da Anbima é que o cliente private deve ter um volume mínimo de aplicação de R$ 1 milhão, mas em diversas instituições financeiras o montante exigido é superior.
No Itaú, por exemplo, para ser private é necessário ter ao menos R$ 3 milhões para investir. O diretor executivo de Private Banking do Itaú Unibanco, Celso Scaramuzza, diz que instituição financeira passou pelo processo de fusão sem perdas na base de clientes deste segmento. Scaramuzza reconhece que o processo de união do Itaú/Unibanco pode ter causado algum desconforto aos clientes private.

“Neste tipo de processo, é obvio que você pode desagradar alguns clientes por conta de mudanças de rotina, mesmo que essas mudanças sejam para melhor. Mas, em contrapartida, houve ganhos, por exemplo, no aumento de ofertas de produtos no private”, afirma ele.

Segundo o executivo, as operações de private de banking do banco, que tem a liderança do setor no Brasil, totalizam ativos de pouco mais de R$ 100 billhões e já aumentaram neste ano 25% sobre 2009. Conforme Scaramuzza, uma das principais estratégias para continuar a crescer neste mercado e, ao mesmo tempo, manter a qualidade do atendimento, foi dividir os clientes private em três categorias de investidores e desenvolver produtos e estratégias específicas para cada um destes três segmentos.

O Itaú mantém no topo da pirâmide os clientes “ultra high”, com investimentos superiores a R$ 50 milhões, vindo em seguida os clientes “high” com aplicações entre R$ 10 milhões a R$ 50 milhões e, finalmente, os clientes que atuam na faixa entre R$ 3 milhões até R$ 10 milhões.
De acordo com ele, clientes “ultra hight” costumam ter uma tendência mais clarade preservação do patrimônio, com aplicações de prazo mais longo. “São investidores que podem abrir mão da liquidez imediata, visando um retorno de longo prazo”, diz o executivo. Já na outra ponta, as prioridades são diferentes: há necessidade de preservar a liquidez, de recursos de curto prazo e o investidor, em geral mais jovem, tende a aceitar um risco mais elevado.

O espanhol Santander, que está finalizando o processo de fusão com o Real, estabeleceu uma novo limite mínimo a partir deste ano para classificar seus clientes como private. Até então, a aplicação mínima necessária era de US$ 1 milhão e agora foi estabelecida em R$ 3 milhões.

Segundo a gerente de Private Banking do Santander Brasil, Maria Eugênia López, a mudança foi feita para adequar o padrão de atendimento aos clientes com níveis de aplicação mais elevados. Ela avalia que o Santander não tenha perda perdido clientes por contas da adequação.

Conforme a executiva, o objetivo é que os bankers - como são chamados os executivos que atendem as contas milionárias- sejam mais do que gestores dos recursos destes clientes, atuando dentro de uma visão abrangente de atendimento, que inclui assessoria em planos de sucessão dentro das empresas e planos de previdência. “O banker virou um diretor financeiro ou de RH do cliente private”, afirma a diretora.

Maria Eugênia destaca ainda que há uma mudança recente no comportamento de muitos destes clientes no que refere à tomada de crédito no banco. “Neste ano, o volume de crédito concedido para clientes private subiu 50%”, diz Maria Eugênia. De acordo com ela, a maioria do crédito é concedido para clientes em busca de liquidez.

Na linha de atendimento “ultra hight” há clientes do Santander com até R$ 1,5 bilhão aplicados que exigem, além de uma gestão especial da seus investimentos, uma discrição absoluta por parte do banco, ressalta a executiva. “Ao contrário do cliente que aplica R$ 3 milhões, quem investe R$ 1,5 bilhão não faz a menor de ser identificado como private, muito pelo contrário, diz ela.

A área de private do Santander cresceu 15% neste ano em volume de ativos, que estão na ordem de R$ 30 bilhões. “O nosso objetivo é ser o maior banco estrangeiro na área de private banking no Brasil”, diz Maria Eugênia.

Instituições financeiras que reforçaram recentemente sua posição na área de private banking apostam que podem se beneficiar da insatisfação com o atendimento prestado pelos grandes bancos que passaram por processos de fusão, casos do Itaú/Unibanco e Santander/Real. O Banco Votorantim, por exemplou, adotou como estratégia investir no atendimento a estes eventuais descontentes. O principal foco são investidores acima de R$ 3 milhões, mas o banco também trabalha com clientes na faixa que parte de R$ 1 milhão.

No Bradesco, o mínimo de investimento de cliente private é de R$ 2 mihões, o dobro do que era estabelecido até julho de 2008. De acordo com o diretor do banco para a área de private, João Albino Winkelmann, a mudança também foi feita para “adequar o atendimento à demanda”. “Vai chegar um momento em que poderemos aumentar esse limite para R$ 3 milhões, mas não há nada decidido ainda sobre isso”, diz ele.

Segundo o diretor, o banco estabeleceu que cada “banker” da área pode atender, no máximo, 80 clientes private, mas a regra muda conforme o perfil da conta milionária. “Há casos em que um gerente atende apenas quatro contas”, afirma o executivo. Essas contas “ultra hight” chegam a alcançar a faixa de R$ 500 milhões de investimento no Bradesco.

Winkermann acrescenta que na categoria private o banco tem uma estrutura de serviços que seria inviável em outros segmentos de aplicação. “Por exemplo, oferecemos uma plataforma de investimentos de arquitetura aberta, em que o cliente pode montar o seu portfólio com qualquer produto do mercado, mesmo que seja de outra instituição financeira. Esse tipo de operação demanda tempo e é altamente especializado, afirma o executivo. Winckemann lembra que outras áreas do banco podem ser acionadas para auxiliar este cliente vip, como na análise de investimentos em novos negócios.

De acordo com Winkermann, o banco tem por política não revelar os volumes exatos do setor, mas diz que o banco já cresceu 22% em ativos no private em 2010 e esperar fechar o ano com uma alta de 27%. Segundo ele, o Bradesco é “seguramente o segundo banco do País no segmento private”.

Já o britânico HSBC, que estabelece uma linha de corte de R$ 2,5 milhões para o cliente private, aposta na presença global do banco como um ativo importante para conquistar o público de alta renda. “O HSBC está presente em 88 países e em mais da metade deles o banco tem operações private. Esta estrutura internacional está disponível para os nossos clientes”, diz o diretor comercial do HSBC Private Banking, José Augusto Miranda.

Segundo o executivo. também ocorre o movimento inverso, com clientes private de outros países utilizando a estrutura do banco no País para buscar portunidades no mercado brasileiro.

Miranda não revela os números do private do HSBC no Brasil, mas diz que o banco aposta no crescimento de suas operações no mercado local. O HSBC inaugurou recentemente um escritório em Recife e tem planos de implantar no próximo ano duas ou três novas unidades private no Brasil. Como seus maiores pares do mercado, o banco também oferece outros serviços, além dos financeiros, aos clientes private como,assessoria tributária e planejamento sucessório.

A maior instituição financeira brasileira, o estatal Banco do Brasil, também resolveu investir neste ano na área de private banking – a linha de corte da instituição está no limite da norma da Anbima, de R$ 1 milhão. O BB Private ampliou da equipe de consultores, de 83 para 111, e reestruturou a área para oferecer mais opções de investimento para os clientes.

A equipe foi reforçada com Flávio Humberto Pretti, da área de clientes institucionais e com experiência em produtos de tesouraria, que passou a ser o gestor de produtos do private do BB. Também foram contratados para área de definição das estratégias macroeconômicas do private os especialistas Pedro Vals, da Fundação Getúlio Vargas, e Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central

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