quarta-feira, 27 de junho de 2012

Recursos de base


Por Paulo Fortuna
Para o Valor, de São Paulo 

Os investimentos no setor de infraestrutura podem ser a alternativa mais viável para o crescimento sustentável da economia brasileira nos próximos anos e a melhor proteção contra as crises que afetam o mercado global. Mas para isso é necessário que sejam criados novos instrumentos de financiamento para o setor e aperfeiçoados os que já existem. De acordo com levantamento da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib),  a expectativa é de entre 2011 e 2015, o setor receba investimentos de R$ 922 bilhões, mas a entidade acredita que esse número poderá ser ainda maior, se forem tomadas medidas para incentivar novos projetos.
Do total de volume de investimentos previstos pela Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), R$ 142 bilhões são destinados ao setor de energia elétrica, R$ 424,5 bilhões para a área de petróleo e gás, R$ 172 bilhões para Transportes e Logística, R$ 98,5 bilhões para telecomunicações e R$ 85 bilhões para a área de Saneamento.
Segundo números atualizados da Abdib, a preços de 2011, os investimentos realizados no setor de infraestrutura, incluindo recursos públicos e privados, aumentaram de cerca de R$ 63 bilhões em 2003 para algo em torno de R$ 170 bilhões no ano passado.
Já o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) estima que o setor receba investimentos totais de cerca de R$ 1,5 trilhão de reais até 2015. Outro levantamento, realizado pela Associação Brasileira de Tecnologia para Equipamentos e Manutenção (Sobratema), indica que os investimentos podem atingir R$ 1,47 trilhão no mesmo período, com a realização de 12.265 obras.
O presidente da Abdib, Paulo Godoy, ressalta que, diante de carências e gargalos existentes em diversos setores, o investimento em infraestrutura pode se transformar num indutor de crescimento para outras cadeias produtivas, com um impulso importante na geração de renda e emprego, além de colaborar para o fortalecimento da competitividade da economia brasileira. “Defendemos que os investimentos em infraestrutura são um antídoto contra os efeitos da crise global”, diz o presidente da Abdib, lembrando que setores como a construção civil são intensivos na geração de postos de trabalho.
Godoy também defende incentivos à poupança interna para que um mercado de financiamento de longo prazo se desenvolva no País. O presidente da Abdib acredita que instrumentos de mercado, como as debêntures para infraestrutura, podem ser mecanismos eficientes para o financiamento de projetos do setor, reduzindo a dependência do BNDES. O banco de fomento do governo federal é hoje o principal financiador de projetos de infraestrutura no País.
 Apesar de destacar o aumento dos aportes em infraestrutura, Godoy ressalta que o setor de petróleo e gás acabou inflando os resultados finais e que há setores que receberam aportes bem abaixo do que seria necessário para fazer frente às necessidades do País. Para ele, o setor de transporte e logística é que o necessita de maiores investimentos, sobretudo porque é uma área chave para a competitividade das empresas brasileiras.
Godoy classifica como positivo o cenário de investimentos para os próximos anos – incentivado por eventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas – mas avalia que os poderiam ser ainda maiores. “Nós estamos realizando investimentos, mas outros países também estão. E há setores, como transporte e logística, em que estamos na rabeira nos índices de eficiência e competitividade”, ressalta o presidente da Adbid.

Godoy defende não somente que o governo promova mais investimentos em infraestrutura, mas também faça melhor gestão dos recursos disponíveis e diminua os entraves burocráticos para o desenvolvimento de projetos com capital privado. “Não é necessário apenas aumentar os recursos, mas melhorar a gestão deles. Com a melhoria da gestão, há ganhos de velocidade, preço e qualidade na execução dos projetos”, afirma ele.

A Abdib apoia o modelo adotado na concessão dos aeroportos de Cumbica, Viracopos e Brasília, em que as empresas vencedores dos leilões terão que pagar, somandas, R$ 24,5 bilhões em outorgas, além de realizar investimentos de R$ 16 bilhões. A entidade acredita que o modelo de concessão pode ser ampliado em outros setores carentes de investimento, como o saneamento básico, que está longe de atender a maior da população brasileira. Para alcançar a universalização dos serviços de água e esgoto, seriam necessários, ao longo de 15 anos, investimentos anuais de R$ 20 bilhões.

O economista do Iedi Julio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e professor da Unicamp, avalia que as melhores alternativas para sair da estagnação da economia estão em reforçar o investimento público em infraestrutura e lançar mão de mecanismos para acelerar a participação do capital privado na indústria e em outros setores da economia. “Os incentivos em infraestrutura resultam em investimentos duradouros que ficam e não podem ser retirados depois”, ressalta ele. 

Ele ressalta que, apesar de positivas, as medidas que o governo vem tomando para enfrentar a crise global, com o incentivo ao consumo de bens duráveis, com o corte de impostos e a redução das taxas de juros do crédito, trazem resultados, mas há o risco de que elas não tenham o mesmo efeito de 2008/2009, quando foram tomadas medidas semelhantes para enfrentar as consequências da turbulência na economia mundial.  “Como já houve estímulo ao consumo para enfrentar a crise de 2008, as medidas tomadas agora podem ter um impacto mais modesto, porque há um limite para que surtam efeito ”, diz o economista.

O BNDES projeta um crescimento no volume de liberações de recursos para o setor de infraestrutura. Nos primeiros quatro meses do ano, o setor de infra-estrutura respondeu por 39% (o equivalente a R$ 13,5 bilhões) do total liberado pelo banco, seguido pela indústria, com participação de 28% (R$ 9,4 bilhões), comércio e serviços (R$ 8,2 bilhões) e agropecuária (R$ 3 bilhões).

As maiores liberações ocorreram nos projetos de transporte rodoviário (R$ 5,5 bilhões) e de energia elétrica (R$ 4,2 bilhões). O ritmo de investimentos deve confirmar as projeções feitas pelo BNDES de desembolsos totais em infraestrutura de aproximadamente R$ 60 bilhões este ano (sem considerar o Finame, linha para a compra de máquinas e equipamentos), acima dos R$ 56 bilhões liberados em 2011.

No último dia 15, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou a liberação de R$ 20 bilhões para investimentos em infraestrutura nos estados. Os recursos fazem parte de uma linha de crédito do BNDES chamada Pró-Investe, com financiamento de 20 anos, um ano de carência e taxa de juros que vai de 7,1% a 8,1% ao ano (TJLP mais 1,1% ao ano para operações com aval da União e TJLP mais 2,1% para operações sem essa garantia). O anúncio foi feito após reunião entre a presidenta Dilma Rousseff e governadores no Palácio do Planalto. Segundo Mantega, as medidas anunciadas fazem parte de uma ação anti-cíclica para diminuir a exposição do Brasil à crise econômica internacional.
O ministro anunciou ainda a redução de tributos incidentes nas Parcerias Público-Privadas (PPPs) -- parceria que União e estados fazem com o setor privado para investimentos -- e a ampliação de 3% para 5% da receita corrente líquida que cada estado poderia comprometer com estas operações.

Um instrumento financeiro que pode incentivar o setor de infraestrutura é a emissão de debêntures por empresas com projetos nesta área. Há um ano, o governo editou a Medida Provisória 563, que está em tramitação no Congresso e ainda precisa ser convertida em lei, estabelecendo esse mecanismo. Com o objetivo de viabilizar fontes alternativas para o financiamento de longo prazo da economia brasileira, a norma, reduziu para zero a alíquota de imposto de renda no investimento de estrangeiros e pessoas físicas em títulos emitidos por empresas, como debêntures. Mas não surtiu o efeito esperado pois nenhuma operação foi realizada até agora.

Para tentar alavancar esses investimentos, o governo mandou para o Congresso um pacote de ajustes na Lei 12.431, que concede benefícios fiscais na captação de recursos voltados a projetos de investimento e infraestrutura.

A expectativa é que as mudanças contribuam para reduzir as incertezas jurídicas que vêm travando as captações. Entre as novidades, está a previsão para que a empresa use os recursos captados dos investidores para pagar compromissos assumidos antes da emissão. Na interpretação de parte do mercado, o texto original da lei não prevê essa possibilidade. Isso significa que a companhia pode, por exemplo, usar o recurso para pagar um empréstimo-ponte realizado para viabilizar o projeto. 
O governo decidiu ainda flexibilizar o percentual alocado em debêntures incentivadas que os fundos de investimento precisam deter para se valer do benefício fiscal, de 98% para 85%. Nos dois primeiros anos, o fundo pode ter uma exposição ainda menor, de 67%.
Mas os agentes do mercado acreditam que o as modificações podem ser ampliadas. Por exemplo, o governo poderia flexibilizar ainda mais a exigência de que 85% no percentual alocado em debêntures incentivadas que os fundos de investimento precisam deter para se valer do benefício fiscal. O benefício fiscal, entretanto, valeria somente para a parcela referente às debêntures destinada ao projeto de infraestrutura, o que facilitaria a formação de fundos de investimento com esse objetivo.
 Apesar do mecanismo ainda não ter decolado, o presidente  BNDES, Luciano Coutinho, estimou que cerca de 30% dos recursos que serão tomados para investimentos em infraestrutura até 2015 podem ser captados essas debêntures vinculadas ao setor. De acordo com ele, podem chegar a até R$ 500 bilhões de reais neste prazo.
Para a advogada especialista em estruturação de projetos de infraestrutura, Rosane Lohbauer Menezes, do escritório MHM, essas ações mostram que o governo está empenhado em estimular a participação do setor privado no setor. Mas ela ressalta que há outras medidas importantes que podem alavancar investimentos, como a desoneração dos investimentos para o setor. Além disso, ressalta, é necessário aperfeiçoar a modelagem de investimentos como as PPPs. Por conta da carência de corpos técnicos, faltam projetos para essa área, destaca a especialista.
A advogada ressalta que existem outros mecanismos de captação de recursos para projetos de infraestrutura que ainda não foram utilizados, mas que podem vir a ter participação importante, como os fundos de Fundos de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE), que possuem benefício fiscal específico para financiamento de projetos de infraestrutura nos setores de energia, transporte, água, saneamento básico, irrigação e outros que o governo federal venha a determinar.



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