Paulo Fortuna
Para o Valor, de São Paulo
A indústria de fundos de investimento no Brasil, que tem
um patrimônio líquido de R$ 2 trilhões, está passando por um novo momento,
proporcionado principalmente pela política de redução dos juros básicos da
economia por parte do Banco Central (BC), que na última reunião fixou a taxa
Selic em 8,5% ao ano. Com isso, os fundos baseados nas taxas de juros básicos
(e também seu espelho, o CDI), como os tradicionais DI, classificados como de
baixo risco, tendem a ser menos atraentes, o que cria uma tendência de migração
por parte dos investidores, como já apontaram os resultados da Associação
Brasileira das Entidades dos Mercados
Financeiro e de Capitais (Anbima).
Os fundos de investimento fecharam o mês de maio com resgate líquido de
R$ 4,236 bilhões, segundo dados da Anbima.
Com a tendência de redução da taxa básica de juros, os fundos DIs
lideraram os saques no mês, registrando saída líquida de R$ 6,740 bilhões. No
ano, a categoria acumula aporte líquido de R$ 17,192 bilhões.
Os multimercados também registram resgate líquido em maio que somaram R$
5,275 bilhões. No ano, no entanto, a categoria acumula entrada líquida de R$
4,780 bilhões.Já os fundos de renda fixa tiveram captação líquida de R$ 3,707
bilhões no último mês, impulsionada pelos fundos renda fixa índice, que podem
aplicar em papéis prefixados e indexados à inflação. No ano, a categoria
acumulava aporte líquido de R$ 24,052 bilhões.
O diretor de Investimentos da HSBC Global Asset
Management, Mário Felisberto, confirma que já há um movimento de clientes, que
preocupados com a perda de rentabilidade dos fundos atrelados à Selic, estão
buscando novas opções oferecidas pela instituição financeira. “O investidor
está tomando consciência de que não adianta ficar somente num investimento
conservador. Se quiser ganhar mais, ele terá que correr mais riscos”, afirma
Felisberto. “O desafio é preparar os clientes para que essa migração seja
gradual e pouco traumática”, destaca o executivo.
De acordo com Felisberto, o HSBC já vinha desenhando a
estratégia de trabalhar com um cenário de juros mais baixos e se preparou para
oferecer aos clientes produtos mais sofisticados. O diretor aponta, por
exemplo, a tendência de fundos de renda fixa baseados em crédito privado ou a
índices de preços (como o IPCA) ou nos fundos multimercado, que podem combinar
renda fixa e variável em sua composição.
Entretanto, ele avalia que momento de mercado não é
recomendável para investimentos em fundos de ações. “A redução nas taxas de
juros tende a favorecer os investimentos em bolsa, mas o mercado de ações tem
sido afetado pela tensão no cenário internacional”, afirma Felisberto.
“Precisamos tem cuidado nesta transição. O investidor que sair diretamente de
um fundo de DI para o mercado de ações pode se machucar”, diz ele.
O Itaú vem se preparando desde 2005 para este momento do
mercado afirma o head da área de Multimercados da instituição financeira,
Marcelo Siniscalchi. “Nós apostamos
neste cenário de convergência de taxas de juros há oito anos e buscamos os
melhores profissionais do mercado para trabalhar dentro dessa estratégia”,
afirma o executivo. “O resultado foi que em 2005 tínhamos um PL de R$ 190
milhões em head funds e hoje chegamos a R$ 5 bilhões”, afirma o executivo.
Com o novo cenário, acredita que os fundos Siniscalchi
multimercados podem ganhar ainda mais espaço, por conta da possibilidade de
diversificação dos investimentos. “É importante que o cliente saia que existem
diversos tipos de fundos multimercados, para perfis diferentes de
investidores”, afirma ele. Há fundos multimercado mais arriscados ou moderados,
com ou sem renda variável na carteira, e o gestor podem optar por ações ou
cestas de moedas, por exemplo.
Paulo Barbosa, sócio da STK Capital, gestora de recursos
com foco em renda variável, afirma que a boas opções no mercado de ações, mesmo
com a volatilidade das bolsas do redor do mundo, inclusive no Brasil. “O
mercado de bolsa é o único que, quando há uma promoção, os clientes saem
correndo da loja”, brinca Barbosa, se referindo ao fato de muitos papéis, em
razão da crise global, estarem excessivamente descontados.
Barbosa ressalta que o investidor de fundo de ações deve
levar em conta um estratégia de longo prazo. Um dos fundos geridos pela STK tem
posições primordalmente compradas, também considerando a capacidade de distribuição de
dividendos das empresas investidas.
Os dividendos são repassados mensalmente
aos cotistas do fundo, o que reduz o imposto de renda incidente sobre os
rendimentos no resgate de cotas (os dividendos são isentos de tributação). De
acordo com ele, a STK também tem apostado em setores e empresas que avaliam ser
promissores, como o Banco Itaú Cosan e companhias que atuam na área de
shoppings.
Marcos Antonio Martins, sócio da Pulsar Invest,
especializada na gestão de grandes fortunas, ressalta que grande parte dos
clientes ainda são conservadores em relação ao grau de risco. Mas, ainda assim,
ele acredita que deve haver uma maior exposição dos investidores em produtos de
renda variável. A Pulsar, através de sua controlada GPS, monta a carteiras de
investimentos de acordo com a necessidade de seus clientes e suas famílias – a
empresa não vende financeiros próprios - que devem ter no mínimo R$ 3 milhões
para aplicar.
Os gestores independentes acham que o novo cenário é
benéfico para as instituições que, segundo eles, têm mais flexibilidade para
atender os clientes da área de fundos do que os grandes bancos, que hoje ainda
concentram grande parte das operações no mercado brasileiro. A Órama Investimentos
aposta na plataforma da internet para oferecer aplicações em fundos para
clientes que têm a partir de R$ 5 mil para investir. De acordo com a consultora
de investimentos da Órama, Sandra Blanco, a proposta é dar ao varejo acesso a
fundos antes limitados aos clientes de altíssima renda dos private banks. “Oferecemos
fundos sofisticados que normalmente exigiriam dos clientes aplicações iniciais
bem mais elevadas”, afirma a consultora de Investimentos.
O diretor técnico da Apogeo Investimentos, Paulo
Bittencourt, acredita que é hora dos investidores de fundos saírem da “zona de
conforto” e procurarem opções mais diversificadas no mercado, embora ressalte
que a migração não será tão fácil, por falta de mais produtos diferenciados. A ideia
é da Apogeo oferecer aos clientes da gestora um “coaching financeiro” para a
escolha do melhor produto compatível com seu perfil.
“Dificilmente um cliente vai sair de um fundo DI e
aplicar diretamente na Bolsa. Ele deve experimentar primeiro um fundo de ações”,
exemplifica Bittencourt. A Apageo tem
sete fundos em
operação, sendo três referenciados DI, dois multimercados e dois de ações. O
público-alvo da gestora são clientes que tenha entre R$ 25 mil e R$ 3 milhões
para investir.
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