segunda-feira, 30 de julho de 2012

Patrimônio revisto

Por Paulo Fortuna
Para o Valor, de São Paulo 

A indústria brasileira de private banking continua a apresentar índices expressivos de crescimento no volume de ativos. O cenário, porém, é desafiador para os gestores das contas desses exigentes clientes. A meta é tentar garantir que seus mais importantes correntistas individuais consigam manter os rendimentos em meio a um cenário de instabilidade global, aliado às sucessivas quedas das taxas de juros básicos no país, que reduziram o ganho de aplicações tradicionais como fundos DI. Instrumentos financeiros não faltam no mercado para atender a esse público, mas nem sempre é fácil convencer os mais conservadores a buscar novas modalidades de investimentos.

De acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) - que considera private os clientes que têm pelo menos R$ 1 milhão de investimento - o volume total de recursos sob gestão nessa área cresceu 6,87% no primeiro trimestre, passando de R$ 434,4 bilhões em dezembro para R$ 464,2 bilhões em março. Mas a quantidade de grupos que investem (pode ser um cliente pessoa física ou uma família) não teve a mesma evolução, caindo 1,33%, para 49.931.
 
Os resultados repetem o quadro apurado nos últimos anos, já que em 2011 a indústria de private banking registrou aumento de 21,6% no volume de ativos, praticamente o mesmo ritmo de expansão observado em 2010, de 22,9%. O crescimento acumulado nos últimos dois anos foi de 49,5%. Já a base de clientes subiu apenas 5,7%, contra 12,2% em 2010, elevando o volume médio de recursos por cliente de R$ 7,5 milhões para R$ 8,6 milhões.

O vice-presidente da Anbima, Celso Portásio, acredita que essa indústria continuará a crescer em ritmo elevado ao longo deste ano, mesmo com as constantes revisões para baixo de elevação do PIB. "O volume de recursos vai aumentar, em termos nominais, de 5% a 6% acima do PIB", diz.
Portásio ressalta que no início deste ano um expressivo volume de fusões e aquisições no mercado brasileiro proporcionou aumento de liquidez para clientes que se enquadram nessa faixa de mercado e, consequentemente, mais recursos a serem administrados. Conforme dados da KPMG, foram realizadas 204 operações nos primeiros três meses, um avanço de 22% em relação ao mesmo intervalo do ano passado.

"Os gerentes private agora têm de convencer seus clientes que, para preservar ou elevar seu patrimônio, eles precisam pensar num alongamento dos prazos de suas carteiras ou assumir outros tipos de riscos", afirma Portásio.
Os resultados registrados pela Anbima no primeiro trimestre mostraram um crescimento de 8,09% nos recursos alocados para fundos de investimentos, para R$ 202,1 bilhões, mantendo ali a preferência entre todos os tipos de aplicações no private, com 43,5% do total, valor similar ao do trimestre anterior.

Os dados mostram que há uma evolução em busca de opções de fundos mais sofisticados. Os investimentos em fundos exclusivos/restritos atingiram R$ 87,5 bilhões, alta de 6,94%. Os fundos estruturados receberam R$ 17,7 bilhões, um aumento de 13,08%.

Já os recursos aplicados em títulos e valores mobiliários avançaram 6,6% no período, para R$ 236,9 bilhões. Nesse segmento, entretanto, a maior alta foi registrada nos investimentos em renda variável, como ações, que cresceram 17,69%. O volume investido em ativos de renda fixa como títulos públicos e privados cresceu somente 2,2%.

Investimento pouco utilizado pelos clientes de alta renda, a caderneta de poupança caiu 35,94% em março, para R$ 3,1 bilhões. Já o montante empenhado em fundos abertos de previdência avançou 12,04%, para R$ 21,6 bilhões.

"Temos que realizar um trabalho junto a alguns de nossos clientes private para que eles façam uma revisão na sua cultura de investimentos e saiam da zona de conforto de aplicações em renda fixa, como o CDI", diz o diretor-executivo do Itaú Private Banking, Celso Scaramuzza. Contudo, lembra Scaramuzza, a virada do mercado também exige mudanças por parte dos próprios executivos do banco que atuam nesse segmento e que devem ser mais proativos.

De acordo com ele, o banco está realizando o chamado "private review", intensificando a revisão periódica das carteiras dos clientes desse segmento, que no Itaú devem ter no mínimo R$ 3 milhões aplicados. "Procuramos oferecer produtos alternativos, como fundos imobiliários, de private equity ou operações estruturadas de tesouraria", destaca o diretor-executivo do Itaú. Scaramuzza ressalta que os gerentes private, por sua vez, também serão avaliados conforme o desempenho dessas carteiras, que podem inclusive ter opções de investimentos em operações no exterior.

Convencer os mais resistentes a enfrentar esse novo cenário exige um atendimento ainda mais personalizado por parte dos bancos, revela o diretor de private banking do Bradesco, João Albino. "O tempo de conversa com os clientes aumentou muito por causa da queda dos juros. Se antes levávamos 10 minutos para discutir as melhores opções, agora levamos 40", diz o executivo. O banco estabelece o piso de R$ 3 milhões.

Albino diz que faz parte do trabalho dos gerentes de private mostrarem aos seus clientes as mudanças no quadro a que estavam acostumados, com juro alto, liquidez e baixo risco, como os CDBs. "É um processo de reeducação", resume.

Para o executivo, os cenários de volatilidade e instabilidade reforçam a posição dos grandes bancos de varejo na área de private banking no Brasil. "Para esses clientes, a solidez da instituição financeira pesa muito no momento de confiar o seu patrimônio", destaca ele.

O vice-presidente de atacado, negócios internacionais e private banking do Banco do Brasil, Paulo Rogério Caffarelli, também avalia que a reputação da instituição financeira acaba sendo decisiva para esse aplicador. "Desde 2008, houve uma migração de clientes private de outros bancos para o BB", afirma Caffarelli.

O executivo ressalta que o BB tem outras vantagens competitivas como a sinergia do private banking com outros setores do banco, como atacado e mercado de capitais. Esse sinergia foi acentuada desde o começo do ano, quando o segmento private passou da área de varejo para a de atacado, que atende grandes empresas. "Muitos clientes da área de private já mantinham um relacionamento com o banco através de suas empresas", lembra o executivo. O BB aceita clientes a partir de R$ 2 milhões de investimento.

Para a diretora do private banking do Santander, Maria Eugênia Lopes, a atuação dos executivos que tratam dessas contas passou a ser ainda mais relevante, sobretudo nos casos daqueles que não viam necessidade de diversificar investimentos por causa dos juros altos. Segundo ela, é necessário reforçar serviços como orientação e assessoria patrimonial. "Agora, mais do que nunca, o atendimento a um cliente private é algo muito mais amplo do que somente orientar seus investimentos', afirma a executiva, citando áreas como a assessoria fiscal e sucessão familiar.
Maria Eugênia destaca que os clientes private não são importantes somente por conta dos recursos que têm para investir na instituição - no Santander também devem ser superiores a R$ 3 milhões. "O cliente private tem um papel aspiracional dentro do banco, não apenas para os correntistas, mas também para os funcionários", ressalta.

"O nível de atendimento aos clientes é o segredo do sucesso nesse mercado", opina o diretor-geral do HSBC Private Bank no Brasil, Gabriel Porzecanski. Para manter a excelência pretendida pelo banco, o foco do HSBC passou a ser clientes com investimentos a partir de R$ 5 milhões, embora os clientes da faixa de R$ 2,5 milhões - que era o limite mínimo - tenham permanecido. "Não queremos ser o maior banco de private banking e sim o melhor", diz ele, sobre a opção por clientes de renda ainda mais elevada.


http://www.valor.com.br/financas/2768190/patrimonio-revisto#ixzz28ReYny00

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