segunda-feira, 19 de março de 2012

Fiscalização tem foco nos grandes

Por Paulo Fortuna
Para o Valor, de São Paulo


A Receita Federal espera manter o ritmo de crescimento das autuações neste ano, repetindo o desempenho do ano passado, quando foi registrada uma alta de 21,25% no valor das penalidades em relação a 2010, atingindo o recorde de R$ 109,3 bilhões. De acordo com o subsecretário de Fiscalização da Receita, Caio Cândido, o órgão vai manter, entre outras ações previstas, a estratégia de focar em grandes contribuintes, responsável em grade medida pelos resultado recorde de 2011. Ele citou como exemplo a seleção de 50 empresas para fiscalização de ágio interno, um tipo de operação em que uma companhia compra outra do mesmo grupo por um valor fictício e superavaliado, com o objetivo de gerar despesa e conseguir deduções. No ano passado, uma operação com o mesmo perfil gerou multas que totalizaram R$ 10,6 bilhões.

Na nossa avaliação, não houve um aumento da sonegação no País e sim um aperfeiçoamento dos métodos de fiscalização da Receita. Acreditamos que neste ano haverá novo crescimento na quantidade e no valor das atuações, embora não há como estimar um porcentual exato”, afirma ele.O subsecretário destaca que os ganhos proporcionados pela melhoria da fiscalização da Receita podem ser ainda maiores. “A fiscalização mais rigorosa aumenta a percepção do risco e inibe a sonegação”, explica Cândido.

De acordo com o subsecretário, o resultado de 2011 foi proporcionado em grande parte por ações tomadas a partir do ano anterior, com a uniformização das regras e a melhoria dos métodos de fiscalização. Segundo Cândido, há hoje uma programação de equipes de fiscalização de grandes contribuintes em todas as regiões do País, além das três Delegacias de Grandes Contribuintes, duas de pessoas jurídicas (São Paulo e Rio de Janeiro) e a outra de pessoa física, de Belo Horizonte, mas que coordena os trabalhos para este segmento nacionalmente.

No caso das pessoas jurídicas, as maiores autuações ocorreram no setor industrial, com R$ 30,9 bilhões. Em relação às pessoas físicas, R$ 1,6 bilhão de multas foram aplicadas a proprietários e dirigentes de empresas. A maior parte das autuações é relativa a compensação de créditos de PIS e Cofins. A Receita cobrou créditos que teriam sido utilizados indevidamente pelas indústrias.

No setor financeiro, as autuações no ano passado atingiram R$ 11,6 bilhões. Neste caso, a fiscalizou apurou principalmente a incorporação indevida de perdas em empréstimos, ou seja, contabilização como prejuízo, e um grande volume de compensações vedadas por lei de PIS e Cofins.


Já no setor de serviços de comunicação, energia e água, a Receita detectou que algumas concessionárias vinham fazendo amortização do valor pago na concessão pelo prazo mínimo de cinco anos, enquanto a Lei diz que é preciso amortizar pelo tempo da concessão. Se a empresa amortiza em prazo menor, ela reduz o imposto de renda a pagar. Neste segmento, as autuações somaram R$ 5,5 bilhões.

No ano passado, houve queda no número de pessoas físicas com problemas na declaração do IR, entretanto subiu o valor das autuações de contribuintes presos na malha fina em 2011. O valor médio cobrado passou de R$ 10,6 mil em 2010 para R$15,7 mil no ano passado. O número de autuações caiu de 520 mil em 2010 para 382 mil em 2011. Entretanto, o valor total cobrado dos contribuintes em multas e imposto cresceu de R$ 5,5 bilhões para R$ 6 bilhões. A possibilidade de regularização das declarações do IR pelo próprio contribuinte explica parcialmente a queda no número de autuações, na avaliação do subsecretário.

Embora o valor total das autuações tenha aumentado, isso não significa necessariamente que este valor chegue ao caixa do governo federal. Segundo o subsecretário, o motivo é o grande número de contribuintes – na faixa de 70% - que recorrem das multas administrativamente, ou seja, dentro da esfera da Receita.


Na maioria dos casos, as penalidades impostas pela Receita são confirmadas após os recursos administrativos. Do total do volume de autuações da Receita, 85% são confirmadas. Em relação ao valor total das multas, o porcentual é de 75%. Ele lembra que, enquanto as multas estão ainda estão em discussão, os contribuintes conseguem obter certidão negativa de débitos, o que é extremamente importante para a atuação das empresas.

Cândido explica que há básica mente três tipos de contribuintes que recebem autuações. Há contribuintes que incorrem em erros nas declarações – em geral, por falta de conhecimento- e outros que trazem informações que consideram corretas, mas divergem da avaliação da Receita. Mas há um terceiro grupo em que o auditor fiscal avalia que existem indícios de crimes contra a ordem tributária ou contra a Previdência Social. Esses casos – que corresponderam no ano passado a 26,35% de todas as autuações – são encaminhados ao Ministério Público Federal.

Segundo o subsecretário, não há números exatos do quanto do valor global das autuações é efetivamente pago ao governo, inclusive porque muitas multas são pagas de forma parcelada e, em alguns casos, anos após a aplicação das penalidades. Mas, de acordo com ele, foram pagos até agora 6% do total das multas aplicadas em 2011. Os contribuintes que deixarem de pagar as multas aplicadas pela Receita estão sujeitos a serem inscritos na dívida ativa da União e a sofrer execução judicial do crédito. Mas ainda cabe recurso das penalidades na esfera judicial, ressalta Cândido.

O vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos Brasileiros de São Paulo (Ibef-SP), André Souza, destaca que os investimentos da Receita em inteligência e tecnologia têm uma contrapartida importante por parte de muitas empresas, que também estão aperfeiçoando suas áreas dedicadas ao setor tributário “Não cabe mais às empresas, seja qual for o porte delas, fazer aventuras tributárias”, ressalta Souza. Segundo o executivo, o novo ciclo de “governança tributária” faz com os que os departamentos dedicadas a área de impostos ganhem mais importância dentro das companhias. “Vemos cada vez mais gerentes ou diretores tributários dentro das empresas, o que proporciona mais qualidade das informações que são enviadas à Receita e evitando inconsistências que poderiam gerar notificações ou multas”, explica ele.

Conforme Souza, a tendência é que as empresas priorizem a “substância econômica” na questão tributária e não somente busquem alternativas para pagar menos impostos. “Mas a gestão competente dessa área pode sim gerar resultados e diminuir o valor a ser pago de tributos”, lembra o executivo. Mas o vice-presidente do Ibef-SP o ressalta que há empresas que acabam penalizadas pela Receita ou pagam impostos indevidamente justamente pela falta de organização na gestão tributária.

O conselheiro do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), Jadson Ricace, avalia que em muitos casos há excesso de rigor por parte da Receita Federal na aplicação das multas, sobretudo quando se trata de empresas de pequeno porte. O conselheiro acredita que a Receita deveria inicialmente notificar as empresas – e não aplicar multas diretamente – nos casos em que ocorreram erros sem indícios claros de sonegação. “Não é justo que uma empresa seja penalizada porque digitou errado um número, sem agir de forma deliberada para sonegar imposto”, argumenta ele, que também defende multas diferenciadas de acordo com o porte econômico da companhia fiscalizada.

Outro problema apontado por Ricace é que nem todas as empresas estão preparadas para trabalhar com o Sistema Público de Escrituração Digital (Sped) o que também pode ter contribuído para ampliar a quantidade de informações equivocadas e consequentemente das autuações. “Ao mesmo que tornou as informações fiscais mais transparentes e facilitando o cruzamento de dados, o Sped também proporcionou à Receita encontrar erros de forma rápida nas informações fornecidas pelas empresas”, destaca o conselheiro.

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